24 agosto 2015

Ah, o tempo!

Comer pé de galinha e arrotar pé de galinha

Vivemos tempos  difíceis, de desencantamento e situações inexplicáveis, hoje  até o papai noel da Lapônia  informa  falência no jornal nacional.  Tanta barbaridade, preconceito, inveja, exibição, gente que quer  demonstrar  o que nem é. 
A gente anda assim procurando inspiração entre uma fala  e outra, se agarrando em leituras, imagens, filmes,situações e  pessoas.
Sorte  é que ainda tem gente de cara lavada  que  faz depoimento verdadeiro e mostra a vida  como ela  é. Sem máscaras, sem maquiagem, sem mais.Eu vi  e gostei,fez um contraponto  com a manhã de segunda-feira que sinceramente me fez pensar que o fim dos tempos está chegando...Me  emocionei é óbvio, como tudo que me toca a alma, como tudo que é bonito, que é leve que é expressão de gratidão. Nada, absolutamente nada  me encanta mais do que pessoas  que são o que são, que não perdem tempo com clichês, com representações. Pessoas de verdade me fazem acreditar que ainda é possível!


15 agosto 2015

É assim que acontece a bondade”

Rubem Alves

“Se te perguntarem quem era essa que às areias e aos gelos quis ensinar a primavera…”: é assim que Cecília Meireles inicia um de seus poemas. Ensinar primavera às areias e aos gelos é coisa difícil. Gelos e areias nada sabem sobre primaveras.., Pois eu desejaria saber ensinar a solidariedade a quem nada sabe sobre ela. O mundo seria melhor. Mas como ensiná-la?
Seria possível ensinar a beleza de uma sonata de Mozart a um surdo? Como, se ele não ouve? E poderei ensinar a beleza das telas de Monet a um cego? De que pedagogia irei me valer para comunicar cores e formas a quem não vê? Há coisas que não podem ser ensinadas. Há coisas que estão além das palavras. Os cientistas, os filósofos e os professores são aqueles que se dedicam a ensinar as coisas que podem ser ensinadas. Coisas que são ensinadas são aquelas que podem ser ditas. Sobre a solidariedade muitas coisas podem ser ditas. Por exemplo: eu acho possível desenvolver uma psicologia da solidariedade. Acho também possível desenvolver uma sociologia da solidariedade. E, filosoficamente, uma ética da solidariedade… Mas o saberes científicos e filosóficos da solidariedade não ensinam a solidariedade, da mesma forma como a crítica da música e da pintura não ensina às pessoas a beleza da música e da pintura. A solidariedade, como a beleza, é inefável – está além das palavras.
Palavras que ensinam são gaiolas para pássaros engaioláveis. Os saberes, todos eles, são pássaros engaiolados. Mas a solidariedade é um pássaro que não pode ser engaiolado. Ela não pode ser dita. A solidariedade pertence a uma classe de pássaros que só existem em voo. Engaiolados, esses pássaros morrem.
A beleza é um desses pássaros. A beleza está além das palavras. Walt Whitman tinha a consciência disso quando disse: “Sermões e lógicas jamais convencem. O peso da noite cala bem mais fundo a alma…”. Ele conhecia os limites das suas próprias palavras. E Fernando Pessoa sabia que aquilo que o poeta quer comunicar não se encontra nas palavras que ele diz; antes, aparece nos espaços vazios que se abrem entre elas, as palavras. Nesse espaço vazio se ouve uma música. Mas essa música – de onde vem se ela se não foi o poeta que a tocou?
Não é possível fazer uma prova sobre a beleza porque ela não é um conhecimento. Tampouco é possível comandar a emoção diante da beleza. Somente atos podem ser comandados. “Ordinário! Marche!”, o sargento ordena. Os recrutas obedecem. Marcham. À ordem segue-se o ato. Mas sentimos que não podem ser comandados. Não poso ordenar que alguém sinta a beleza que estou sentindo.
O que pode ser ensinado são as coisas que moram no mundo de fora: astronomia, física, química, gramática, anatomia, números, letras, palavras.
Mas há coisas que não estão do lado de fora. Coisas que moram dentro do corpo. Estão enterradas na carne, como se fossem sementes à espera…
Sim, sim! Imagine isso: o corpo como um grande canteiro! Nele se encontram, adormecidas, em estado de latência, as mais variadas sementes – lembre-se da história da Bela Adormecida! Elas poderão acordar, brotar. Mas poderão também não brotar. Tudo depende… As sementes não brotarão se sobre elas houver uma pedra. E também pode acontecer que, depois de brotar, elas sejam arrancadas… De fato, muitas plantas precisam ser arrancadas, antes que cresçam. Nos jardins há pragas: tiriricas, picões…
Uma dessas sementes é a “solidariedade”. A solidariedade não é uma entidade do mundo de fora, ao lado de estrelas, pedras, mercadorias, dinheiro, contratos. Se ela fosse uma entidade do mundo de fora, poderia ser ensinada e produzida. A solidariedade é uma entidade do mundo interior. Solidariedade nem se ensina, nem se ordena, nem se produz. A solidariedade tem de brotar e crescer como uma semente…
Veja o ipê florido! Nasceu de uma semente. Depois de crescer não será necessária nenhuma técnica, nenhum estímulo, nenhum truque para que ele floresça. Angelus Silesius, místico antigo, tem um verso que diz: “A rosa não tem porquês. Ela floresce porque floresce”. O ipê floresce porque floresce. Seu florescer é um simples transbordar natural da sua verdade.
A solidariedade é como um ipê: nasce e floresce. Mas não em decorrência de mandamentos éticos ou religiosos. Não se pode ordenar: “Seja solidário!”. A solidariedade acontece como um simples transbordamento: as fontes transbordam… Da mesma forma como o poema é um transbordamento da alma do poeta e a canção, um transbordamento da alma do compositor…
Já disse que solidariedade é um sentimento. É esse o sentimento que nos torna mais humanos. É um sentimento estranho, que perturba nossos próprios sentimentos. A solidariedade me faz sentir sentimentos que não são meus, que são de um outro. Acontece assim: eu vejo uma criança vendendo balas num semáforo. Ela me pede que eu compre um pacotinho de suas balas. Eu e a criança – dois corpos separados e distintos. Mas, ao olhar para ela, estremeço: algo em mim me faz imaginar aquilo que ela está sentindo. E então, por uma magia inexplicável esse sentimento imaginado se aloja junto aos meus próprios sentimentos. Na verdade, desaloja meus sentimentos, pois eu vinha, no meu carro, com sentimentos leves e alegres, e agora esse novo sentimento se coloca no lugar deles. O que sinto não são meus sentimentos. Foram-se a leveza e a alegria que me faziam cantar. Agora, são os sentimentos daquele menino que estão dentro de mim. Meu corpo sofre uma transformação: ele não é mais limitado pela pele que o cobre. Expande-se. Ele está agora ligado a um outro corpo que passa a ser parte dele mesmo. Isso não acontece nem por decisão racional, nem por convicção religiosa, nem por mandamento ético. É o jeito natural de ser do meu próprio corpo, movido pela solidariedade. Acho que esse é o sentido do dito de Jesus de que temos de amar o próximo como amamos a nós mesmos. A solidariedade é uma forma visível do amor. Pela magia do sentimento de solidariedade, meu corpo passa a ser morada de outro. É assim que acontece a bondade.
Mas fica pendente a pergunta inicial: como ensinar primavera a gelos e areias? Para isso as palavras do conhecimento são inúteis. Seria necessário fazer nascer ipês no meio dos gelos e das areias! E eu só conheço uma palavra que tem esse poder: a palavra dos poetas. Ensinar solidariedade? Que se façam ouvir as palavras dos poetas nas igrejas, nas escolas, nas empresas, nas casas, na televisão, nos bares, nas reuniões políticas, e, principalmente, na solidão…
“O menino me olhou com olhos suplicantes.
E, de repente, eu era um menino que olhava com olhos suplicantes…”.
Rubem Alves, no livro “As melhores crônicas de Rubem Alves” 

14 agosto 2015

Aqui é o meu lugar

Eu nasci aqui, no tempo em que aqui vinham pessoas  de toda  a região pra nascer. Por ser o hospital mais próximo de toda  a comarca. Eu cresci na cidade  vizinha " a  minha" , lugar onde amo ir, chegar, ver o sol nascer e se por. Depois de muito tempo , duas décadas exatamente eu vim morar aqui. E o lugar onde minha filha nasceu  e passou quase  toda  a sua infância. Eu vivo aqui, amo este lugar, agradeço o pão de cada dia que tenho graças ao trabalho que presto aqui, para as pessoas. Eu trabalho no serviço público e tal qual o café que servimos, e que  brinco que nem parece de prefeitura, assim também é o trabalho e o repeito que tenho pelo que faço e pelas pessoas  com as quais convivo. Talvez por que minha composição seja esta que me chateei grandemente quando vi aquela manchete. Me deu vontade de brigar, sair  do campo das ideias  e chamar pra briga mesmo. Evidente que isto seria tão ridículo quanto a falta de  propósito que vi ali em letras garrafais. E quando me sinto assim... eu preciso escrever, uma forma mais eficiente de promulgar o que sinto.

Nossa Cidade para quem não conhece se localiza no sul do país, foi colonizada por italianos e alemães, pessoas de fibra e que enfrentaram muitas intempéries  para construir casas, igrejas,escolas e vendas. Foi luta braçal mesmo de gente aguerrida  que trabalhou até muito depois do sol se por  e começou antes de sua chegada. Nossa  cidade tem 57 anos, este é o tempo que  faz  que  foi emancipada política e administrativamente. Somos de pequeno porte, os habitantes não chegam a dez mil e pra mim isso realmente é muito bom. Temos ainda  as benesses dos pequenos lugares, o povo se  conhece, sabe onde mora, identifica as várias  gerações que aqui  vão crescendo. Temos muito verde ao nosso  redor, comida farta nas mesas, emprego para quem gosta de trabalhar. Tá meu olhar é otimista diante da vida. Eu sei que o estrada da entrada da cidade precisa de nova pavimentação, que os mineradores merecem melhor condição de vida,sei bem da crise  que assola o país, de receitas  caindo,de dificuldades de fazer gestão com as pessoas e recurso que temos, sei nossa equipe sabe de muitos projetos que poderiam ser executados e que nos falta dinheiro, gostaríamos de mais obras e reformas também na educação, gostaríamos de ter mais cultura e lazer para nossas  crianças. Crianças e adolescentes estes  que aliás  são o grande motivo pelo qual trabalho todo dia, em período integral  e contrariando as  leis  trabalhistas eu trabalho a noite também, com os pais e professores  deles. Eu desejo que  eles tenham um lugar cada vez melhor para viver, eu sou idealista mas  também  sou realista não tapo o sol com a peneira  e consigo perceber  que vale a a pena lutar por dias  melhores. Minha indignação é toda para com aquelas pessoas  que não conseguem perceber a grandiosidade de viver aqui, a bondade que as pessoas  ainda possuem, a segurança que mesmo  com os dois policiais apenas é mantida, porque aqui ainda dá pra  dormir de janelas abertas. O meu lugar é feliz a grande maioria das pessoas  é gente de bem,os valores  que eu construí aqui encontram referência. Eu sei que faço a minha parte, durmo  tranquila em detrimento de algumas pessoas  que apontam, escrevem, publicam a hipocrisia de tudo  que é "lamentável" por aqui. E talvez seja  pelo fato de fazer a minha parte  que me sinto ultrajada  quando generalizam tudo e colocam  na vala  comum, como se nada fosse certo, se ninguém estivesse na luta. As pessoas  deveriam ter mais cuidado em fazer generalizações. As pessoas que receberam o aval de outras pessoas deveriam ter cuidado elevado ao cubo ao dizer algumas  coisas  e apontar outras. É necessário separar o joio  do trigo, é necessário ser mais digno para  fazer críticas desta natureza, isso não foi uma afronta a esta ou aquela pessoa, a este  ou aquele partido... esta foi uma ofensa  as pessoas  de bem que vivem neste lugar , que felizmente é a sua grande maioria.Pra mim, aqui está longe de ser o pior lugar do mundo pra viver. Eu sinto assim, eu respiro assim, eu vivo assim, eu faço a minha parte. Abomino a hipocrisia de quem só sabe criticar, apontar defeitos e falhas e pior, que nem pode se sentar (como  dizia minha avó, quem tem rabo não se senta), mas prefere com o dedo em riste julgar tudo e todos. Talvez eu devesse ser um espírito mais evoluído e nem levar em consideração as palavras, por terem  vindo de quem vieram e também sem verdade nas  suas entrelinhas, mas  confesso  fiquei injuriada.
A prece de hoje é simples: Senhor, livrai-me de gente azeda, ingrata  e incoerente! Amém.

P.s Ajude para que mudem de cidade, ou de planeta!





02 agosto 2015

Em dias de julho que tem calor .

Em  alguns dias  que o sol tá  brilhando, que o calor definitivamente não é de julho, que se para pra dar um respiro e o  desapegar  vira palavra de ordem. 
Mas desapegar de verdade.
Daquele jeito que parece  que nada deve  ficar nas  gavetas e guarda-roupas. Nem a renite atrapalha neste dias. Tudo é remexido e revirado e de  algumas  coisas  a despedida é inevitável.
Lido bem com roupas e sapatos antigos nestes dias, e tudo deve ser entregue rápido pra não dar dor no coração e vontade de guardar novamente... E assim foi!
Mas os papéis, os  bilhetes, as  fotos, os  cadernos... ah, alguns já tem mais de duas décadas  e nunca chega  a hora de reciclar. Eles mais  do que qualquer outra  coisa  refletem um tempo, vivências  e momentos que não voltarão jamais. assim é  com aquele diário de nascimento, o caderno da faculdade, o da pós...As cartas, (sim, eu guardo cartas e  bilhetes) algumas  fotos  fora de lugar. 
Não foi desta vez  que eles  se  foram, resistiram  a milésima faxina  e  continuam ali guardados para que possam ser vistos, tocados relembrados. 
Que  bom que eu desenvolvi o hábito de escrever e que nos meus registros eu consegui descrever o que sentia em cada um dos momentos.
O que mais me surpreende é exatamente a mesmíssima proporção em que mudei e que outras  coisas permanecem sendo "valor" desde  aquelas épocas. presumo que é assim mesmo que eu gosto de ser.
O tempo tem sido rápido e me assusta a velocidade e as marchas  que me impõe. Eu sigo, renovada de  lembranças e de saudades. Agradecida por vivências  que não trocaria por nada nesta  vida, pessoas  que foram e  continuam sendo especiais  e  referências.
Os ácaros  andam lucos pela casa e meus olhos inundados de coisas  boas.




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Só o pó!